Cristiano Ronaldo não fez nada de extraordinário, fez o correto
Cristiano Ronaldo não fez nada de extraordinário, apenas fez o correto. Se o passe para Bruno Fernandes no 3-0 foi tão valorizado terá sido porque, antes na carreira, Ronaldo não terá tomado sempre aquela decisão. Se foi tão surpreendente, terá sido porque naquela situação, antes na carreira, Ronaldo terá tomado a decisão de ser ele a rematar.
Cristiano vai continuar a procurar o golo. Aliás, de tudo o que de positivo veio à seleção do jogo frente à Turquia um golo do capitão foi a única coisa que faltou. Porque Cristiano Ronaldo vai continuar a procurá-lo insistentemente, muitas vezes com opções que, se calhar, podiam ser outras, mas que em grande parte, antes na sua carreira, terminaram com a bola no fundo das redes. Esse é o seu o jogo, é a sua natureza competitiva e não se pode negá-la a um homem que tem quase 900 golos na carreira. Seria o mesmo, por exemplo, que dizer a Stephen Curry para não lançar de três pontos ou a Max Verstappen para abrandar.
Ainda assim, aproveitemos o altruísmo do capitão para nos «embebedar» numa esperança maior. A seleção foi boa frente à Turquia. Aliás, foi muito boa e deixou grandes sensações em quem viveu o duelo de Dortmund.
Há exatos três meses, escrevi aqui que ainda sentia falta dessa embriaguez coletiva em torno da equipa, mas o que veio da Alemanha foi, desde o campo, à cor e ao som de algo a celebrar-se.
Ser português não me define, ou melhor, é uma noção demasiado estreita para aquilo que sou. Mas está claro que partilho convosco, compatriotas, uma série de manias, características, gostos ou afeições, para além, claro está, desta versão da língua portuguesa em que comunicamos. O que se tem em comum raramente se manifesta entre nós, embora saiamos todos à rua nos Santos, para logo a seguir dizer que o São João é melhor que o Santo António ou vice-versa e meter o São Pedro ao barulho. Isso, claro está, é também muito nosso. Mas afasta-nos.
Pela sua dimensão, a Seleção de futebol é, portanto, uma raridade, capaz de aproximar indivíduos desavindos em tantas outras coisas. Fá-lo quando vence da maneira que venceu a Turquia.
Ouviu-se um cântico português em Dortmund – «Sou, de Portugal eu sou, a todo o lado eu vou, só para te ver ganhar…» – que já se tinha ouvido, em menor força, em Leipzig. Talvez tenha pronúncia do Norte na origem, mas parece estar a ganhar força orgânica, seja com variantes de Lisboa, Viseu, ilhas, dos PALOP ou do Brasil.
Nós, portugueses, somos de todos estes lados e estamos representados numa Seleção que, de acordo com o que cantamos, seguiremos a apoiar independentemente das raízes de quem está em campo.
Lá chegará o dia também em que tenhamos portugueses de Bombaim, Jacarta ou Tegucigalpa na equipa das Quinas.
Não será preciso fazer nada de extraordinário, é só preciso fazer o correto. Como dar uma assistência a quem está ao lado e por vezes fingimos não ver. Se o maior português da História o fez…