Craque do Sporting está em risco

Gyokeres está a fazer correr muita tinta e, desta vez, não é pelos golos que tem marcado — o último foi a 22 de janeiro, na derrota com o RB Leipzig (1-2), na Champions, vindo de um ciclo de cinco jogos consecutivos a faturar. O tema é a condição física do sueco. Não está a 100 por cento, nem perto disso.
O último registo de Gyokeres em campo durante os 90 minutos é na final da Taça da Liga, no dérbi com o Benfica, a 11 de janeiro, sendo que depois disso o Sporting já fez mais sete jogo em que o sueco cumpriu muito menos tempo em campo: com o RB Leipzig entrou aos 54 minutos, na receção ao Nacional jogou de início e saiu aos 89’, depois falhou encontros com Bolonha e Farense, voltou a jogar no clássico com o FC Porto no Dragão, saltando do banco aos 69’ e na passada terça-feira, diante do Dortmund em Alvalade, foi lançado aos 58 minutos.
Há muito que Rui Borges fala em gestão do avançado, que está com fadiga muscular, que é gerido dia a dia, mas, tendo em conta a importância do jogador no plantel, as questões têm sido mais do que muitas, o que já irritou o treinador, que frisou não ser médico e que não lhe compete estar a especificar a lesão de Gyokeres.
Pois bem, A BOLA falou com dois médicos, especialistas em medicina desportiva, para tentar perceber se seria ou não benéfica que Viktor Gyokeres parasse para se restabelecer a 100 por cento em vez de estar a ser gerido com pinças durante tanto tempo.
«Não sei ao certo a lesão que ele tem. Mas, em princípio, se for uma lesão que esteja curada e se ele estiver a jogar é decisão do departamento médico, porque se estiver lesionado certamente que não tem autorização para jogar. Se pode agravar o problema? Não, pode é não estar na condição física ideal, mas se está autorizado a jogar é porque a lesão está debelada, é esse o protocolo que segue. Enquanto o atleta está lesionado não tem alta, não pode jogar nem treinar-se. A partir do momento em que pode treinar-se de forma condicionada ou querendo jogar, não vai agravar, isso nunca se faz», realçou Rui Miller, especialista em medicina desportiva, em declarações exclusivas a A BOLA.
Quanto ao facto de, claramente, Gyokeres não se apresentar a 100 por cento, embora possa somar minutos, o médico realçou: «Um atleta que esteja parado, por muito pouco tempo que seja, quando recomeça a atividade nunca está a 100 por cento. Se ele está parado e recomeça a atividade após uma lesão precisa sempre de um período de adaptação. Poderá não fazer os 90 minutos, mas poderá fazer uma parte do tempo, que penso que é o que está a acontecer agora.»
Rui Borges, sempre questionado a cada conferência de imprensa sobre a condição daquele que é um dos jogadores mais influentes — soma 3286 minutos repartidos por 41 jogos, tem 42 golos marcados e 11 assistências —, deixou claro que a decisão de utilizar Gyokeres é conjunta: «Tudo requer o seu tempo, nesse aspecto nós, equipa técnica, departamento de alta de performance, departamento médico e jogadores tomamos decisões em conjunto, porque aqui nada é feito ao acaso, nada mesmo, é tudo num conjunto, especificamente já falei isso com o Vikor [Gyokeres] e, em conversa entre todos, vemos aquilo que é melhor para a equipa, a equipa é o Sporting, é nisso que nos focamos», disse, na antevisão ao jogo com os alemães do RB Leipzig.
Confrontado sobre a não titularidade do sueco no clássico no Dragão, o que deixou os adeptos leoninos desiludidos, o treinador respondeu assim: «Gyokeres tem estado parado e, por mais gestão que tenha, vai perdendo capacidade física. Por mais que ele seja um animal competitivo, que é, temos de ter cuidados. Os adeptos queriam e eu também queria tê-lo 90 minutos, mas prefiro tê-lo 30 do que nenhum.»
RESPONSABILIDADE TRIPARTIDA
José Martel, médico ortopedista que durante muitos anos foi o responsável pelo departamento clínico do UD Leiria no principal escalão do futebol português, disse a A BOLA que a simbiose entre as partes envolvidas é fulcral.
«São casos de gestão em que o problema não é revelado, porque hoje em dia é assim, tem de haver sigilo médico entre jogador e departamento médico e muitas vezes até utilizam uma autorização para nós fornecermos informações clínicas. Por exemplo, dizer-se que é uma entorse acaba por ser muito vago. Ou uma mialgia de esforço, não damos a noção da gravidade, primeiro para não se saber da gravidade da lesão, o que pode não desvalorizar o jogador», começou por dizer.
«Não sei qual é o problema do jogador, mas há situações que até se curam em campo. Há mialgias de esforço que até o treinar com menos intensidade faz bem. Mas, a atitude de utilizar um jogador em gestão não pode ser assumida pelo departamento médico, normalmente a responsabilidade é tripartida entre o departamento técnico, médico e jogador. E um bom departamento médico tem de falar muito com o treinador e com o jogador, dizendo há este risco de acontecer alguma coisa, porque o jogador sente-se bem, mas quer jogar, o treinador quer tê-lo no banco para alguma eventualidade e a responsabilidade tem de ser assumida entre os três», finalizou.
«NÃO PODE SER SÓ SEGREDOS…»
Mesmo com tanto burburinho em torno do assunto Gyokeres, os leões não se pronunciam. «O Sporting não faz comentários sobre o boletim clínico dos jogadores, a menos que se trate de uma situação grave ou de longa duração. É política do clube e uma questão de ética médica», disse apenas fonte leonina.
A BOLA falou com António Cunha Vaz, consultor de comunicação. «Em termos de comunicação seria benéfico até para o próprio clube e para a sua imagem que, não se querendo dizer tudo, porque o segredo também é a alma do negócio, houvesse talvez um comunicado oficial ou uma declaração do presidente aos meios de comunicação do clube, para não ser só o treinador a falar, a dar o corpo às balas, digamos assim. Vou acrescentar mais uma coisa, acho que há um momento em que isto devia acontecer. Para o bem e para o mal, o Sporting está em 1.º lugar no campeonato, a jogar na Liga dos Campeões, algo que até há pouco tempo, quatro anos, não acontecia com tanta regularidade, e falamos de um negócio que vive da percepção que os adeptos têm daquilo que se passa, não pode ser só segredos, porque se não os adeptos não têm percepções e inventam coisas», realçou.
«Acho que o Sporting devia vir a público dizer que não há nenhum segredo à volta da situação de Gyokeres, não tem nenhuma lesão especial, o corpo humano é feito para suportar uma determinada carga de trabalho e o jogador, até pelas suas características e pela vontade que tem de jogar, atingiu o pico de carga de trabalho agora, todos os jogadores têm picos de forma e depois decaem um bocado, e ele atingiu esse pico», finalizou.